quarta-feira, 29 de abril de 2015

Casa na Duna, de Carlos de Oliveira


Casa na Duna é um romance de 1943 passado na zona da gândara numa época lá muito atrás, quando os camponeses tinham grandes dificuldades económicas, havia muita miséria e fome e os fidalgos se aborreciam com a vida monótona que levavam. 
A história foca-se em Mariano Paulo, dono de uma quinta na aldeia de Corrocovo, que faz o que pode para evitar a compra de máquinas para trabalhar a quinta. O seu filho, Hilário, é um estroina conflituoso que não tem qualquer interesse em nada, e não se prevê que vá fazer alguma coisa da vida. É um retrato de uma sociedade exploradora e explorada tendo como cenário as areias brancas das dunas do mar da gândara.
Casa na Duna foi publicado pela primeira vez em 1943.Aqui não sabemos o que mais admirar — da desenvoltura da escrita à densidade do tema, passando pelas principais personagens, jamais reduzidas a caricaturas. Isto num autor que, à época, só tinha 22 anos!Corrocovo, a aldeia da novela, funciona como poderosa metáfora de um país arcaico e claustrofóbico, ainda dominado pela atmosfera rural. Lá, como no Portugal inteiro, há homens a viver como os bichos. Mas o seu empenhamento social não leva o autor a perder uma atracção quase poética pela natureza. Abundam descrições sugestivas como esta: Hilário gostava do Inverno à solta. Céus a desabar, casebres submersos, pinhais vergados ao peso das bátegas, água e vento contra a janela. Passava as noites acordado enquanto o ar de roldão devastava tudo. Ocorriam-lhe histórias nebulosas da infância. Bruxas, lobisomens, botas de sete léguas.O grande fascínio deste livro surge ao nível da técnica estilística: o autor joga com mudanças súbitas de tempo, de forma verbal, de sujeito narrativo. Por influência do cinema, recorre a flashbacks para diversificar a acção. Inspirado em autores como Hemingway, Caldwell e Jorge Amado — que marcaram todo o neo-realismo português —, cultiva o parágrafo curto, seco, incisivo. Nesta prosa não há um adjectivo a mais, nem um vocábulo fora do lugar. Por sua vez, também ele influenciou outros: é nítido o parentesco entre Casa na Duna e O Delfim (1967), de Cardoso Pires.Carlos de Oliveira (1921-81) deixou-nos uma obra de ficção lamentavelmente curta, com apenas cinco títulos editados em 35 anos, mas de qualidade indiscutível. Basta que a memória ceda apenas um momento para os mortos estarem perdidos, escreveu ele em Casa na Duna. Até por isso, é urgente lembrá-lo. E lê-lo.Pedro Correia — Diário de Notícias.
Fonte: fnac.pt

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