"Havemos de engordar juntos." Começava assim a crónica que me prendeu a atenção desde a primeira frase até à última: "Agora, neste tempo, acredito que me resta engordar sozinho."
José Luís Peixoto escrevia sobre o amor burguês, aquele que as canções e os poemas não falam. "As canções e os poemas ignoram tanto acerca do amor. Como se explica, por exemplo, que não falem dos serões a ver televisão no sofá? Não há explicação. O amor também é estar no sofá, tapados pela mesma manta, a ver séries más ou filmes maus. Talvez chova lá fora, talvez faça frio, não importa. O sofá é quentinho e fica mesmo à frente de um aparelho onde passam as séries e os filmes mais parvos que já se fizeram. Daqui a pouco começam as televendas, também servem."
Parei para reflectir sobre este assunto, realmente não me lembro de nenhum poema, nenhuma canção ou até uma carta de amor onde se falasse do amor ao partilhar a manta do sofá, ou ao fazer as compras no supermercado, ou ao colocar as compras em sacos separadas por categorias. Os poemas não falam do dia a dia do amor, das pequenas coisas que ajudam a construir o amor. Acrescento ainda o amor de quando um está doente e o outro lhe faz um chá e vai buscar mais uma manta.
Continuava José Luís Peixoto, "Quando se teve e se perdeu, a falta de amor é estar sozinho no sofá a mudar constantemente de canal, a ver cenas soltas de séries e filmes e, logo a seguir, a mudar de canal por não ter com quem comentá-las. Ou, pior, ainda, é andar ao frio, atravessar a chuva, apenas porque se quer fugir daquele sofá."
Li de novo, marquei a página e sorri, pensando numa forma de guardar esta crónica na minha mente por tempo indeterminado.
A crónica da autoria de José Luís Peixoto saiu na pág. 12 da Revista Visão de 12 de Janeiro de 2012, também disponível no site do autor.
1 comentário:
Também li. e curiosamente também guardei :) Muito bem pensado!
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